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O mundo do trabalho passa por uma verdadeira revolução. As novas tecnologias provocam enormes mudanças. Profissões desaparecem, aparecem e se transformam, assim como os modos de contratar, remunerar e promover se modificam. Há atividades que são exercidas com base no convencional emprego assalariado e fixo. Outras requerem contratos por projeto e remuneração atrelada à produção, e não a salário. Há contratos de emprego por prazo indeterminado em que os profissionais trabalham em várias empresas, e não só em uma. O mercado de trabalho é um verdadeiro caleidoscópio: a cada momento surgem novas formas de trabalhar.
No caso brasileiro, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não dá conta de proteger quem trabalha sob tamanha diversidade. Como achar na CLT as proteções para os jovens especialistas em Tecnologia da Informação que só aceitam trabalhar em horários erráticos? Como remunerar com salário fixo os profissionais que executam projetos científicos ou criam uma obra de arte ou um sistema de inteligência artificial? Como proteger os cirurgiões que são obrigados a trabalhar em tempos variados porque a natureza não programa a chegada da doença ou a hora do nascimento da criança?
Tamanha variedade de situações não pode ser administrada por leis gerais e que se referem a apenas uma parcela do mercado de trabalho atual. Foi isso que levou os países avançados a fixar a maior parte das proteções trabalhistas nos contratos negociados, porque a livre negociação permite criar proteções ajustadas a diferentes realidades. Neles, as leis asseguram as proteções gerais e os contratos negociados fixam as proteções específicas. Há, assim, uma simbiose de legislação e negociação que preside a contratação, a remuneração, a promoção, o descanso, etc. Isso sempre foi assim nos países de cultura anglo-saxônica. Vários outros países, porém, vêm reformando seus estatutos no sentido de ampliar o papel das negociações coletivas na fixação das condições do trabalho (ver Labour market reforms tracker, Londres: Freshfields Bruckhaus Deringer, 2015). A Alemanha liderou o movimento. O primeiro-ministro Gerhard Schroder, em 2003, preparou o país para 2010. Acertou em cheio, pois seu país se tornou referência de produtividade alta e desemprego baixo.
As demais nações da Europa vieram a patrocinar tais mudanças em razão da crise que se instalou em 2008. A Espanha abriu espaços para mais negociação em 2012; Portugal, em 2013; e Itália, em 2014. A França examina, neste momento, uma reforma que visa a dar grande força aos contratos negociados.
Por isso tudo, vi com grande alegria a aprovação do relatório do deputado Daniel Vilela na comissão que examina a Medida Provisória n.º 680 (Programa de Proteção ao Emprego), estabelecendo que "as condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo prevalecem sobre o disposto em lei, respeitados os direitos previstos na Constituição e nas normas de proteção da saúde e segurança do trabalho". A regra é voluntária: segue quem quer.
Já era tempo de o Brasil valorizar a negociação coletiva e, com isso, garantir direitos ajustados às mais variadas condições de trabalho. O Brasil tem sindicatos fortes, centrais sindicais atuantes e conta com um instituto que pesquisa e prepara dirigentes sindicais com reconhecida competência (Dieese). Trata-se de uma preciosa garantia para praticar daqui para a frente a verdadeira negociação coletiva.
Há muita coisa que pode ser acertada por negociação. Por que manter a hora noturna em 52 minutos, como quer a CLT? Por que exigir um descanso não remunerado antes de a mulher começar a fazer hora extra? Por que impedir que gestores e diretores sejam remunerados por desempenho? Por que não estimular o uso de comissões de conciliação para dirimir eventuais conflitos? Em suma, a prática das liberdades encontrará nessa nova regra um horizonte infinito.
* José Pastore é professor da FEA-USP, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras
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